O rompimento de duas barragens da mineradora Samarco, em novembro de 2015 na zona rural de Mariana (MG), provocou o maior desastre ambiental da história do Brasil e trouxe à tona o desrespeito às leis ambientais e a falta de fiscalização por parte do poder público. As barragens operavam segundo o sistema de aterro hidráulico, tradicional e empregado em todo o mundo. Ele conta com a ação da gravidade para fazer com que os resíduos separados do ferro escoem até bacias. A parte frontal dessas bacias é feita de areia, para filtrar a água.
Ainda sem o laudo definitivo, a principal hipótese levantada pelos técnicos, contudo, é que tenha ocorrido o processo de liquefação, que se dá quando essa camada arenosa externa, em vez de expelir, retém a água. Uma variação brusca na pressão interna do depósito de rejeito pode então transformar areia em lama, que não consegue mais conter os resíduos que estão atrás. Isso explicaria o rompimento da barragem de Fundão — o que arrasou a de Santarém e tudo o mais que havia pela frente
O desastre ambiental pode ser definido como resultado do descaso com o descarte inadequado dos resíduos (rejeitos) e falta de manutenção estrutural das barragens, o que culminou na morte de dezenas de pessoas, centenas de desalojados, degradação ambiental e prejuízos à economia e sociedade local.
O mar de lama, que inundou a região e toda extensão do Rio Doce até o oceano Atlântico, é formado por rejeitos sólidos e líquidos consequentes das atividades de mineração. Amostras encontram concentração de partículas de metais pesados como chumbo, alumínio, ferro, bário, cobre, boro e mercúrio. Com isso, praticamente foi decretado o fim do Rio Doce, um dos mais importantes de Minas Gerais.
Na exploração de minério de ferro, a única solução que a mineração dá para o tratamento do rejeito é a barragem. Especialistas afirmam que a atividade depende da extração de grandes quantidades de material para ser lucrativa e, com isso, se produz muito resíduo. Porém, o rejeito é material que deve ser armazenado para proteção do meio ambiente.
Irregularidades não solucionadas
Segundo dados divulgados pela imprensa da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais (Semad) e do Sistema Integrado de Informações Ambientais do Estado de Minas Gerais (Siam), a Samarco coleciona autos de infração.
Entre os mais graves problemas, se destacam irregularidades nas barragens, problemas em minerodutos que escoam ferro e água para o litoral capixaba e infrações em operações minerárias diversas, que envolvem a extração, transporte do material, separação e disposição dos rejeitos.
Licenças e fiscalização
As minas, usinas e barragens precisam de licenciamento do Estado e, para serem concedidas, há condicionantes – etapas que o empresário deve cumprir. Também toda licença ambiental tem validade, de duração variável. Na renovação, novas condicionantes são solicitadas, como monitoramento e programas de comunicação com as comunidades.
Em Mariana, especialistas que acompanharam o processo de concessão de licenças explicaram à imprensa que, como as barragens locais são antigas, os processos vão se misturando, sem que condicionantes sejam cumpridas.
No caso da barragem de Fundão - rompida agora -, em 2007, deveria ter sido entregue uma avaliação de ruptura. Essa condicionante voltou a entrar na revalidação da licença em 2013, assim como a construção de ações emergenciais de preparo às comunidades para situações de risco. No entanto, em 2014, a Samarco avisou ao governo que não faria esse preparo.
Diante disso, o que se conclui é que há um descumprimento das normativas de um lado e, de outro, a irresponsabilidade do poder público quando da renovação das licenças, postergando obrigações.
Marco regulatório
Um projeto de lei que reestrutura o marco regulatório da mineração no Brasil está em discussão desde 2003, na Câmara dos Deputados. Entre os seus principais pontos, está a forma de concessão da exploração das minas, a taxa de royalties e a criação de uma agência nacional que regule o setor.
No entanto, movimentos da sociedade civil defendem que a mineração no País vá além de uma discussão administrativa e tributária, e apontam a necessidade de serem incluídos itens sobre a proteção socioambiental.